Bioenergética

        Termodinâmica é o estudo das transformações da energia, e a ciência que estuda as propriedades macroscópicas de um sistema e as transformações de energia por ele experimentadas, sendo que as propriedades macroscópicas de um sistema são o produto do movimento caótico de seus átomos ou moléculas, o que por sua vez, é influenciado pelas interações diversas que ocorrem entre os átomos e moléculas e também com o meio que os cerca. O poder da teoria termodinâmica está justamente em fazer inferências sobre as propriedades do sistema, baseando-se em seus estados de equilíbrio que precedem ou antecedem uma transformação físico – química qualquer.

      A termodinâmica inclui três leis com várias conseqüências em diversas áreas do conhecimento, como na bioquímica celular. As células necessitam de um aporte contínuo de energia para a manutenção da sua organização e para a realização de trabalho. Assim, de maneira grosseira, podemos dizer, com base em princípios termodinâmicos, que a vida é possível às custas do aumento na entropia do meio ambiente e que seres vivos obtém ordem causando desordem (quebra) dos nutrientes que assimilam o que se dá através do metabolismo. Como sistemas abertos que trocam energia e matéria com o meio ambiente, os organismos vivos nunca estão em equilíbrio. Continuamente consomem materiais às custas dos quais mantém a sua ordem interna, sendo que as células vivas possuem processos de transformação de energia que são muito eficientes e que se baseiam na síntese e quebra de moléculas de modo cíclico e contínuo. Esse processo de transformação e de aproveitamento energético persiste até à morte do indivíduo.

       A bioenergética estuda como diferentes processos promovem a transformação de energia em sistemas vivos, com base nas leis da termodinâmica.

A Primeira Lei: Conservação da Energia

“Qualquer que seja a forma de energia considerada, a quantidade de energia total de um sistema será sempre constante, isto é, a energia nunca desaparece, ela é sempre transformada de um tipo de energia para outro.”

         Esta lei relaciona a conservação de energia durante os processos onde trabalho e calor são trocados com as vizinhanças do sistema. Em resumo, a energia interna (U) de um sistema é conservada, não pode ser criada nem destruída mas pode ser convertida de uma forma em outra forma de energia.
A variação de energia é a diferença entre o calor (q) liberado ou absorvido em relação ao meio ambiente e o trabalho (w) realizado pelo sistema:

[ΔU = Ufinal – Uinicial = q – w ] então [ΔU= q – w]

Calor (q) é reflexo do movimento aleatório das moléculas, o trabalho (w) é definido como força vezes deslocamento (reflexo do movimento organizado das moléculas).

Entalpia

        A maioria das reações ocorre em fluidos (gases ou líquidos). Nesse caso, o trabalho (w) realizado é do tipo pressão-volume (PV). Define-se, então, um novo conceito, a entalpia (do grego enthalpein, aquecer) H e é dada pela equação [H = U + PV], onde U, P e V são respectivamente energia interna, pressão e volume.

O “aquecimento” (variação de entalpia – ΔH) pode ser definido como:
[ΔH = ΔU + ΔPV = q – w + ΔPV]

        Em células vivas, as reações bioquímicas ocorrem a pressão e volume constantes, ou seja, o trabalho pressão-volume PV é nulo. Nesse caso, [ΔH = ΔU] pois ΔPV = 0
Uma variação na entalpia de um sistema é igual ao calor liberado ou absorvido [ΔH = q]. Pode-se observar que quando transferimos energia como calor, a entalpia do sistema aumenta. Quando energia deixa o sistema, a entalpia diminui.

A Segunda Lei: Entropia

“Todo sistema possui uma função de estado extensiva, chamada entropia e que apresenta as seguintes propriedades: Durante um processo reversível a entropia do universo permanece constante. Para os processos irreversíveis, a entropia do universo aumenta.”

        Os conceitos e formulações matemáticas da Segunda Lei permitem o entendimento e a previsão do sentido dos fluxos de energia observados experimentalmente. Através da Segunda Lei, é possível rever também o conceito de reversibilidade de reações, o que significa que o sentido de execução de um processo reversível pode ser invertido a qualquer instante. Para processos irreversíveis, uma vez iniciado o processo, ele é irreversível, pois a partir do primeiro instante o sistema evolui para um outro estado finitamente diferente da estado anterior
A primeira lei dizia somente quanta energia é transferida numa reação: “Se uma reação ocorre, a energia total permanece inalterada” ela nada informa do porque que algumas reações ocorrem mas outras não. Somente a segunda lei pode nos informar sobre o que pode e o que não pode ocorrer.

Entropia e Desordem

        Energia e matéria exibem uma tendência a se tornar cada vez mais desordenadas. A medida da desordem é a Entropia (S). A segunda lei diz que “a entropia de um sistema isolado aumenta no decorrer de uma reação espontânea”.
O grau de desordem de um sistema é indicado pela Entropia (S). Em sistemas vivos, a variação de entropia pode ser determinada a partir de medidas de calor, pela equação:

[ΔS = q / T]

   Onde q é a energia transferida como calor e T é a temperatura. Se energia (q) é transferida ao sistema, uma desordem é provocada, gerando aumento na entropia.

Espontaneidade

     Reação espontânea ocorre sem influência externa. Os processos espontâneos são caracterizados pela conversão de ordem em desordem e tem tendência a serem processos irreversíveis, ou seja, tem direção.
Para uma dada transferência de energia, ocorre maior variação na desordem quando a temperatura é baixa do que quando é alta. Isso é explicado pois as moléculas de um sistema frio têm pouca agitação térmica: o aumento de energia agita-as mais do que se o sistema já estivesse quente ou a uma maior temperatura.

A Terceira Lei: Energia Livre

“A entropia de qualquer cristal perfeito de substâncias ou elementos puros é zero quando a temperatura absoluta é zero”

     Este é o enunciado físico da terceira lei, que pode ser esclarecido dizendo-se que a terceira lei da termodinâmica estabelece conceitualmente o estado padrão de entropia, definindo o zero da escala de medição desta propriedade.

       Willard Gibbs é considerado o maior cientista nascido em solo americano. Ele aplicou os conceitos da termodinâmica à bioquímica. Seu conceito de energia é representado por G, vulgarmente conhecido como “energia livre” ou entalpia livre. Gibbs percebeu que, na matéria viva, energia na forma de calor (q) é nula e não pode ser usada para realizar trabalho (w); criou, então, o conceito de “Energia Livre“, energia que está disponível, livre, para realizar trabalho. Esta Terceira Lei é, na verdade, um agrupamento das 2 primeira leis:

Primeira Lei: Quando há conversão de uma forma de energia em outra, a eficiência não pode ser maior do que 100%. Por isso, é chamada “lei da conservação de energia”.
Segunda Lei: Quando ocorre transferência de energia, a eficiência não pode ser maior que 100%.

As duas leis são relacionadas à energia livre de Gibbs pela equação:

G = H – TS = [ΔG = ΔH – TΔS]

 onde:
G = energia livre , H = entalpia, S = entropia, T = temperatura

       A primeira lei está representada por ΔH, variação de entalpia (calor trocado numa reação). ΔH foi medido para as reações importantes e é apresentada em tabelas de química geral. A segunda lei está representada por ΔS, variação de entropia (aleatoriedade ou “desordem”).

Energia Livre de Reação: ΔG

Essa quantidade é definida como a diferença de energia entre produtos e reagentes:

[ΔG = Gprodutos – Greagentes]

       As células usam “energia livre”, pois são máquinas químicas (não físicas) que funcionam a pressões e temperatura constantes. Além disso, trabalho pode ser realizado apenas quando a variação de energia livre (ΔG) é negativa após a conversão de reagentes em produtos.
“O mundo tende ao caos” e “a vida contraria a 2ª lei da termodinâmica”.

          Estas são duas frases famosas oriundas da não compreensão do conceito embutido na 2ª lei (entropia). Ou seja: A matéria viva é altamente organizada e representa uma diminuição local da entropia – superado pelo aumento de entropia nos arredores. A matéria viva não está em equilíbrio – reações bioquímicas estão ocorrendo a todo momento – literalmente, quando o equilíbrio foi alcançado, ocorreu a morte do ser vivo e só então cessam as trocas de matéria e energia com o meio ambiente, logo, seres vivos são sistemas abertos.
A energia livre, a energia, a entalpia e a entropia são funções de estado. Isso significa que seus valores dependem somente do estado atual do sistema, e não de como o sistema atingiu tal estado. É por isso que as medidas termodinâmicas podem ser feitas analisando apenas os estados inicial e final (ignorando o modo pelo qual entalpia e entropia variaram durante esse processo). Podemos saber o ΔG da oxidação completa da glicose analisando o estado inicial (glicose + O2) e final (CO2 + H2O), sem necessidade de medir entalpia e entropia de cada uma das várias reações intermediárias entre os materiais de partida e os produtos finais.
As reações termodinamicamente possíveis ou expontâneas têm ΔG negativo, ou seja, energia é liberada. Produtos têm menos energia que substratos ou reagentes. Por isso, essas reações são chamadas exergônicas (ergon, trabalho), que significa “liberar energia”.

     Quando ΔG é positivo a reação é não espontânea (“impossível”) – mas o processo reverso é espontâneo. Reações desse tipo são endergônicas, que significa “absorve energia”.
Quando ΔG = 0, variação de energia nula, o processo está em equilíbrio.

Análise Técnica da Energia Livre de Gibbs
Agrupando-se as equações da primeira e segunda leis da termodinâmica, obtemos:

ΔS > q / T = ΔH / T
ΔH – TΔS < 0
ΔG = ΔH – TΔS

      Essa equação, formulada em 1878 por Gibbs, é conhecida como o “critério de espontaneidade das reações”. Processos espontâneos, sob pressão e temperatura constantes, possuem variação negativa de energia livre:

[ΔG = ΔH – TΔS < 0]

       Assim, se ΔG > 0 a reação é endergônica e o processo é não espontâneo porque só ocorre se for forçado pela introdução de energia livre. Se houver acréscimo de entalpia (ΔH> 0) – que se opõe ao processo, só ocorrerá reação se a variação de entropia (ΔS) for suficientemente positiva (ΔS > 0).
Ao contrário, havendo decréscimo na entropia (ΔS < 0, seres vivos), só ocorrerá reação se a variação de entalpia for suficientemente negativa (ΔH < 0).

 

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